As inovações tecnológicas
precisam ser absorvidas no âmbito processual. O processo
eletrônico1,
assim denominado porque seu procedimento utiliza meios físicos que
são o objeto de estudo da parte da física chamada eletrônica,
representa o mais contundente passo dado na direção da
concretização de princípios processuais que, nas últimas décadas,
representaram pouco mais que formulações utópicas de “comandos
de otimização”2,
muitas e constantes vezes ridicularizados pelos fatos. Inclua-se,
entre eles, até mesmo aquele inserido no artigo 5º, inciso
LXXVIII3,
da Constituição da República Federativa do Brasil.
À necessidade de absorção
contrapõem-se os cuidados necessários para que das inovações não
resultem danos, só melhorias. Nesta perspectiva, e seguindo a
cartilha do construtivismo principiológico inaugurado por Dworkin e
absorvido pelo Direito continental constitucional europeu a partir da
década de 70 do século passado, de onde espraiou-se para a teoria
geral do Direito, é preciso traçar os contornos gerais dessa
absorção. A integridade sistêmica do Direito deve ser preservada,
com e apesar das necessárias, inadiáveis e louváveis inovações
tecnológicas.
As balizas para esse movimento
de renovação e avanço do processo têm sido expressas por
inúmeros princípios4,
ventilados por diferentes autores, às vezes sob nomenclatura
diversa. Eles são indispensáveis, primeiro, porque os conflitos
de interesse gerados pelas inovações vão esbarrar em vazios
normativos onde a solução será feita pelo recurso aos princípios5.
Mas tais princípios, voltados à orientação da incorporação da
tecnologia da informação ao processo – que o legislador chama de
“informatização do processo judicial”6
-, devem subordinar-se a um princípio maior e aqui proposto sob a
denominação de princípio da dupla instrumentalidade ou da
sub-instrumentalidade processual da tecnologia.
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1
Entende-se que o mais pertinente seria a utilização da expressão
“procedimento eletrônico”, pois o que está em questão é
“[...] o meio extrínseco pelo qual se instaura, desenvolve-se e
termina o processo; é a manifestação extrínseca deste, a sua
realidade fenomenológica perceptível.” CINTRA, Antônio Carlos
de Araújo, et al. Teoria Geral do Processo. 17.ed.
São Paulo:Malheiros, 2000. p. 277. No entanto, adota-se a
terminologia do próprio legislador. Ver a Lei 11.419/2006, em
vários dispositivos do capítulo III - Do processo eletrônico
(Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11419.htm.
Acesso em: 26 set. 2008).
2
Conforme a atual natureza reconhecida aos princípios. Nesse
sentido, vejam-se: (i) Robert Alexy, para quem princípios são
comandos de otimização que determinam que se realize algo na maior
medida possível, em consonância com as condições jurídicas e
reais existentes (ALEXY, Robert; GARZON VALDES, Ernesto. Teoria
de los derechos fundamentales. Madrid:Centro de Estudios
Políticos Y Constitucionales, 1993, p. 86-87); Ronald Dworkin, que
introduziu os princípios na teorização do Direito, eles
associam-se à dinâmica das ordens jurídicas duradouras, pois as
tornam moldáveis;” (DWORKIN, Ronald. O
império do direito. São
Paulo:Martins Fontes, 1999. p. 488); e ainda, com visões
semelhantes, HESSE, Konrad. Elementos de direito constitucional
da República Federal da Alemanha. Tradução de Luiz Afonso
Heck. Porto Alegre:Sérgio Fabris, 1998. p. 61 e CANOTILHO,
J.J. Gomes. Direito constitucional e
teoria da constituição. 6.ed.
Coimbra:Almedina, 1995. p. 1148-1149.
3
“LXXVIII - a todos, no âmbito judicial
e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo
e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.” BRASIL.
Constituição[1988]. Constituição da República Federativa do
Brasil. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
constituicao/Constituiçao.htm. Acesso em 26 set. 2008.
4
Para mais detalhes sobre a importãncia dos princípios na atual
teoria constitucional, remete-se o leitor aos artigos: PEREIRA, S.
Tavares; ROESLER, Cláudia Rosane. Princípios, constituição e
racionalidade discursiva. Universo Jurídico. Disponível
em:
<http://www.uj.com.br/publicacoes/doutrinas/default.asp¿action=doutrina&coddou=5670>.
Acesso em: 26 set. 2008 e MARTINS, Argemiro Cardoso Moreira;
CADEMARTORI, Luiz Henrique Urquhart. Hermenêutica
principiológica e ponderação de direitos fundamentais: os
princípios podem ser equiparados diretamente a valores?. Jus
Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1453, 24 jun. 2007. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/ doutrina/texto.asp?id=9952>. Acesso
em: 07 abr. 2008.
5
Écio Oto Ramos Duarte situa essa questão ao falar da elucidação
(resolução) dos “[...] casos difíceis (hard cases), onde
a contraposição das argumentações se situa no âmbito do
sopesamento de valores.” DUARTE, Écio Oto Ramos. Teoria do
discurso e correção normativa do direito. São Paulo:Landy,
2003. p. 54.
6
BRASIL. Lei nº 11.419, de 19 de dezembro de 2006. Dispõe sobre a
informatização do processo judicial; altera a Lei no 5.869, de 11
de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil; e dá outras
providências. Diário Oficial [da] República Federativa do
Brasil, Brasília, DF, 20 dez. 2006. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei11419.htm.